Florbela Espanca assume para Matosinhos elevada importância por vários factores de entre o quais destaco: Foi a cidade do norte do país, para onde veio residir com o segundo marido. Foi também nesta cidade que casou pela terceira vez (e a primeira religiosamente) e foi ainda a cidade onde preparou a sua última publicação, onde faleceu e onde os seus restos mortais estiveram sepultados até a sua trasladação em 1964 para Vila Viçosa.
Quando Florbela Espanca, já separada do seu primeiro esposo, vivia uma relação amorosa com António Guimarães, alferes miliciano da Guarda Nacional Republicana, que viria a ser o seu segundo marido, pretendeu vir viver para junto dele, uma vez que este havia sido colocado no Destacamento de Artilharia do Porto, no Forte de S. João Baptista, vulgo Castelo da Foz do Douro. Numa das suas cartas, para o seu “adorado Toninho”, como assim o tratava, escreveu: “Não sei o que esperas para alugar casa. Dizes que a questão é ir, pois te digo que a questão é ter um buraco, por modesto que seja. Palácio ou tenda na praia, o que preciso é casa minha.”.
Acabaram por fixar residência na rua do Godinho 146, em Matosinhos. em Agosto de 1920. Só mais tarde, Janeiro de 1921, foram morar para o Castelo da Foz do Douro.
Casa da Rua do Godinho, n.º 146 |
Depois de ter casado com Guimarães a 03 de Julho de 1921, em casamento civil celebrado no posto n.º 1 da Foz do Douro, da 2.ª Conservatória do Porto, que funcionava na Rua Central, 1034, actual Rua do Padre Luís Cabral e dele se ter separado mais tarde, iniciou uma relação amorosa com Mário Lage, médico de Matosinhos, que diziam ser um “bom samaritano” que outra coisa não teria feito senão dar-lhe firmeza e conforto na sua vida.. Lage foi tenente médico do mesmo Destacamento de Artilharia do Porto, da G.N.R.., no Castelo da Foz, de Julho de 1920 a Fevereiro de 1922, data a partir da qual passou a exercer as funções de sub delegado de saúde de Matosinhos.
Florbela padecia de várias complicações de saúde, tendo sido este médico a tratá-la. O que os terá aproximado e que os levou a apaixonarem-se um pelo outro.
Contraiu matrimonio com Mário Lage, na Igreja de Matosinhos, em Outubro de 1925.
Passaram a morar na casa de família do médico, na rua 1.º de Dezembro, 540, em Matosinhos. E é aqui que encontra finalmente um lar onde todos a tratam bem, todos lhe procuram dar consolo para os seus males tamanhos do corpo e da alma, como relata Maria Alexandrina no livro A vida ignorada de Florbela Espanca, edição da autora em 1965. Refere ainda nessa publicação que Florbela “passa as tardes deitada na areia doirada olhando o mar inquieto e que ela admirava tanto e é ali, entre o verde das águas e o azul do céu, que confidencia a Guido Bottelli (um amigo italiano que a ajuda na tentativa de apressar a edição daquela que terá sido a sua última obra "Charneca em Flor") os seus tormentos de menina, as suas desilusões de adolescente e a sua ventura chegada quando é já mulher experimentada de tantas dores..."
Escreveu José Carlos Fernández, no seu livro Florbela Espanca, A Vida e a Alma de uma Poetisa, edição Nova Acrópole, em Fevereiro de 2011, que numa festa celebrada no Hotel do Porto, no final do verão de 1930, uma amiga de Florbela apresenta-lhe o advogado Ângelo César, do Porto e juntos iniciam um romance. “A poetisa está de novo apaixonada”, refere Fernández. Mais diz que a poetisa terá oferecido a César, uma aguarela, da autoria de seu irmão Apeles, já falecido, e dois sonetos, “Quem sabe…” e “Trazes-me em tuas mãos de vitorioso”, que dedicou a este novo amor.
Não chega a ver publicado o seu último livro. Depois da prolongada doença se intensificar e a reter em casa, vem a falecer na madrugada do dia 08 de Dezembro de 1930.
A casa onde viveu Florbela Espanca com Mário Lage e onde morreu, na Rua 1.º de Dezembro, 544, em Matosinhos |
Ter-se-á suicidado porque lhe foram encontrados, debaixo do colchão, dois frascos vazios de “Veronal”, sonífero que tomava regularmente. A certidão de óbito é assinada por um carpinteiro! (sabe-se lá porquê), com a causa da morte “edema pulmonar”. Para que ninguém da profissão médica se visse implicado em mascarar o tipo de morte, escreveu Carlos Fernández. Mário Lage, o marido, num telegrama urgente que enviou, dando conta da sua morte, escreveu laconicamente “morreu Florbela Lage”.
Depois das exéquias fúnebres, foi a sepultar no cemitério de Sendim, em Matosinhos. Mais tarde, em 17 de Maio de 1964, foram os seus restos mortais trasladados para a sua terra natal em Vila Viçosa.
Máscara de Florbela Espanca, da autoria de Irene Vilar. Câmara Municipal de Matosinhos, em 1982. |
QUEM NOS DEU ASAS PARA ANDAR DE RASTOS?
QUEM NOS DEU OLHOS PARA VER OS ASTROS
- SEM NOS DAR BRAÇOS PARA OS ALCANÇAR?
FLORBELA ESPANCA
Para além da escultura (máscara) da autoria da saudosa escultora Irene Vilar, patente num pequeno jardim na confluência das ruas, Tomás Ribeiro e Ló Ferreira, Florbela Espanca tem perpetuado o seu nome na toponímia da cidade e na Biblioteca Municipal de Matosinhos. Também a Universidade Sénior desta cidade adoptou o seu nome.
Florbela Espanca que num dos seus poemas, cantado por Luís Represas, no tema “Perdidamente” escreveu:
“ser Poeta é ser mais alto, é ser maior do que os homens!”
Morreu muito jovem. E só mais tarde lhe foi reconhecida a verdadeira grandeza que tem e merece.
Notas:
A primeira foto, em cima, é da casa para onde veio Florbela viver em Matosinhos. Não é totalmente visível na imagem (colhida a partir do Google Earth) o último piso da casa, mas não é importante pois terá sido construído muito depois de a poetisa ali ter morado. Porem mantém a mesma varanda, as três janelas e as quatro portas primitivas.
A segunda foto, também em cima, é da casa onde viveu e faleceu Florbela Espanca. É propriedade particular e foi objecto de grandes obras há relativamente pouco tempo. Na parede frontal, abaixo das janelas, foi aberta a entrada de garagem, que se vê na foto. Felizmente o avançado no telhado, onde supostamente ainda existirá o aposento que a poetisa usava para as sua escrita, foi salvo e totalmente reparado.
Agostinho Barbosa Pereira, em 12 de Agosto de 2012.
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